Afeganistão: um ano depois do regresso dos Talibãs ao poder

O dia 15 de agosto marcou um ano do regresso dos Talibãs ao poder no Afeganistão. As Agências das Nações Unidas mostram-se apreensivas com o colapso da economia, bem como o agravamento da situação humanitária e dos direitos humanos. Os especialistas pedem maior representatividade no governo para favorecer a reconciliação e a estabilidade.

As Nações Unidas destacam retrocessos em áreas como a economia, a política, a sociedade, os direitos humanos e a igualdade de género. Segundo dados recentemente divulgados, mais de metade dos 41 milhões de afegãos está abaixo da linha da pobreza. Quase 23 milhões enfrentam insegurança alimentar. Cerca de 2 milhões de crianças sofrem de desnutrição e há comunidades que ficaram ainda mais vulneráveis depois do terramoto que abalou o país há seis meses.

Com a ascensão dos Talibãs ao poder, o país da Ásia Central perdeu a ajuda ao desenvolvimento, as reservas de pagamentos internacionais foram congeladas e as sanções foram agravadas.

Unicef/Alessio Romenzi

Desigualdade de género

O responsável da ONU no Afeganistão, Ramiz Alakbarov, considera que o mundo está a assistir a uma reversão significativa de direitos económicos, políticos e sociais e “a uma escalada preocupante de políticas e comportamentos restritivos” de género. “Sem o direito à educação, ao trabalho e à liberdade de movimento, as mulheres são cada vez mais postas à margem da sociedade”, acrescenta.

A UNICEF informou que o custo de ter jovens meninas fora do ensino secundário chega a representar 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) anual. Estima-se que se 3 milhões de alunas concluíssem o ensino secundário e entrassem no mercado de trabalho, contribuiriam com, pelo menos, 5,4 mil milhões de dólares para a economia do Afeganistão.

A diretora executiva da ONU Mulheres, Sima Bahous, enfatiza a ideia de aniquilação de “décadas de progresso em igualdade de género e direitos das mulheres em poucos meses.” Existe um apelo às autoridades para que se abram escolas para todas as raparigas, se removam as restrições ao emprego das mulheres e se revoguem todas as decisões e políticas que as privam dos seus direitos.

O aumento dos preços dos alimentos e dos combustíveis foi agravado pela seca e pela guerra na Ucrânia. A ONU Mulheres estima que 95% da população afegã, e quase todas as famílias chefiadas por mulheres, ficaram sem o suficiente para se alimentarem.

Os especialistas destacam que em nenhum outro lugar do mundo o ataque aos direitos das mulheres e raparigas foi tão “amplo, sistemático e abrangente, com aspetos das suas vidas a serem restringidos sob o pretexto da moralidade e através da instrumentalização da religião”.

UNICEF/Hasinullah Qayoumi

Atentados aos direitos humanos

Execuções extrajudiciais, desaparecimentos, detenções arbitrárias, tortura, riscos elevados de exploração, inclusive para fins de casamento infantil e forçado, são algumas das violações aos direitos humanos que se têm visto no último ano.

Existe uma rutura no Estado de direito, sobre o qual “não se vislumbra qualquer intenção de cumprimento da promessa dos Talibãs em respeitar os direitos humanos”.

Entre as questões que mais preocupam os especialistas estão a abolição de mecanismos e instituições independentes de supervisão de direitos humanos, especialmente a Comissão Independente de Direitos Humanos do Afeganistão.

Os desafios incluem o comprometimento da administração da justiça e a liberdade de imprensa com restrição do acesso à informação. Muitos jornalistas e ativistas saíram do país e abandonaram as suas atividades. O mesmo aconteceu com educadores, professores e artistas.

Verificam-se ainda ataques a minorias religiosas e étnicas, alguns reivindicados pela organização militar do Estado Islâmico Isil-KP. Para os peritos, continua a faltar capacidade ou vontade dos Talibãs em proteger essas pessoas.

Com sinais de deterioração da situação humanitária, o apelo feito à comunidade internacional é de que garanta com urgência ajuda aos afegãos em coisas básicos para viver: comida, água, educação, meios de subsistência e um lar seguro.

No início do período no poder, os Talibãs prometeram que seriam menos radicais. Os especialistas querem que as autoridades cumpram as suas obrigações sob os tratados internacionais, dos quais também o Afeganistão faz parte.


Direito Internacional e Justiça

Entre as maiores conquistas das Nações Unidas está o desenvolvimento de um corpo de leis internacionais, convenções e tratados que promovem o desenvolvimento económico...