Campanha anual #IDONT quer ajudar a acabar com o casamento precoce

O dia do casamento de uma mulher é suposto ser um dos mais felizes da sua vida, celebrando o amor e o compromisso entre ela e a pessoa com quem escolheu casar de livre vontade.

No entanto, para demasiadas raparigas em todo o mundo, as suas capacidades para fazerem essa escolha foram-lhes negadas, sendo forçadas a casarem-se ou a unirem-se informalmente com homens escolhidos por outrem, sem terem tido qualquer palavra a dizer ou meios de escapar. O casamento pode estar entre os piores dias das vidas das cerca de 12 milhões de raparigas que, todos os anos, são forçadas a casarem-se antes de completarem o seu 18º aniversário. Se o progresso para o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de acabar com esta prática nociva até 2030 não for acelerado, o mundo terá mais de 150 milhões de raparigas que se tornaram noivas demasiado cedo.

Aos 15 anos, Zulaikha, no Afeganistão, estudava e sonhava em tornar-se médica, mas a sua família, que vivia na pobreza, arranjou o seu casamento com um homem com quase o dobro da sua idade e apesar dos seus protestos e do facto de o noivo pretendido estar desempregado, foi forçada a casar contra a sua vontade.*

© UNFPA Yemen

Quase imediatamente, Zulaikha deixou de ter autorização para continuar a ir à escola e o seu marido começou a descarregar a sua raiva e frustração nela. Ele batia-lhe quase diariamente e, no Outono de 2019, ela foi ao hospital provincial na província de Laghman por causa de uma fractura da órbita do olho e de uma lesão nas costas. Na ala de emergência, ela foi identificada como vítima de violência baseada no género, por isso, Zulaikha recebeu apoio psicossocial e legal, bem como formação em várias competências. O seu marido acabou por ser condenado por abuso e condenado a seis meses de prisão.

“Nenhuma rapariga deve ser impedida do que ela sonha”, expressou ela. “Este é o direito de todas as raparigas”: de decidir o seu futuro”.

Enraizado na pobreza e na desigualdade de género, o casamento infantil prejudica a saúde e o bem-estar das raparigas. Considerando que os corpos das jovens ainda não estão completamente desenvolvidos, é possível que não estejam preparados para uma gravidez. Nos países em desenvolvimento, complicações relacionadas com a gestação e o trabalho de parto são a principal causa de morte das raparigas entre os 15 e os 19 anos de idade. Adicionalmente, estas jovens estão também em risco de contraírem infeções sexualmente transmissíveis, de sofrerem violência doméstica e de isolamento social. Muitas raparigas são também obrigadas a abandonar a escola, o que limita a sua capacidade de auferir um rendimento.

Desde jovem que sonho em ser médico de obstetrícia e ginecologia, devido ao número crescente de mortes como resultado do casamento precoce. Quando a guerra irrompeu e o conflito aumentou [no Iémen], muitas famílias sofreram, perdendo os seus empregos e tornando-se deslocadas. [Também] eu me mudei com a minha família em busca de (…) segurança.

© UNFPA Yemen

Aos 14 anos, fui casada com um primo dez anos mais velho do que eu, numa pequena cerimónia. Deixei a escola, os meus amigos e a minha família. Estava infeliz, mas não tive outra escolha senão aceitar a situação e no espaço de um mês fiquei grávida.

Quando as circunstâncias estabilizaram o suficiente, os meus pais voltaram para a nossa antiga casa, deixando-me sozinha com o meu marido. Para minha surpresa, ele começou a maltratar-me. Começou a duvidar que a criança fosse dele e muitas vezes bateu-me no estômago, numa tentativa de pôr fim à gravidez.

Tentei comunicar com a minha família em vão, até que chegou o dia em que não consegui suportar a violência e as hemorragias e pedi proteção a um espaço seguro [apoiado pela UNFPA] de que tinha ouvido falar.

Após semanas a receber sessões de apoio psicológico no espaço seguro para mulheres e raparigas, melhorei muito e a minha mente estava ocupada com a criança que iria nascer.

O espaço seguro também tinha um programa de formação profissional e eu aprendi a alfaiataria durante três meses para me poder sustentar e eventualmente tornar-me formadora para ensinar outras mulheres.” conta Ibtisam com apenas 16 anos.*

Todos os dias de São Valentim desde 2015, o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, na sigla inglesa) tem apelado à comunidade internacional a dizer #IDONT (traduzido para “eu não [aceito]”) para mostrar apoio às raparigas de todo o mundo que dizem “eu aceito” no contexto de matrimónios forçados.

Apesar de esta realidade ser mais comum em países em desenvolvimento, em Portugal registaram-se 171 casamentos precoces em 2019, o que revela um aumento desde o ano anterior. Legalmente, é possível um menor de 16 a 18 casar caso obtenha o consentimento dos pais.

O casamento infantil é uma violação dos direitos humanos, que nega a uma rapariga a sua autonomia corporal, marcando o fim da sua infância. O casamento deve ser o alvorecer de um novo começo, mas para estas raparigas, não passa de algo que frustrará os seus sonhos e as fará perder toda a esperança.

Pode contribuir com a sua doação para ajudar os esforços do UNFPA e apoiar jovens e mulheres aqui.

*Nome alterado para proteger a identidade das testemunhas.


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