ONU: aumento “chocante” de violações contra crianças em conflitos em 2023

UNICEF/Tess Ingram Um rapaz recupera no hospital em Gaza depois do abrigo onde vivia com a sua família ter sido bombardeado

 

A violência contra as crianças envolvidas em conflitos armados atingiu “níveis extremos” no ano passado, com um aumento “chocante” de 21% nas violações extremas, afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, num relatório publicado na quinta-feira. 

 

Um número sem precedentes de crianças foram mortas e mutiladas em locais como Israel e nos territórios palestinianos ocupados, nomeadamente em Gaza e ainda no Burkina Faso, na República Democrática do Congo, no Sudão e na Ucrânia, revelou o relatório anual sobre Crianças e Conflitos Armados. 

O aumento alarmante resultou da evolução da situação, da complexidade e da intensificação dos conflitos armados, bem como da utilização de armas explosivas em zonas povoadas, segundo o relatório. 

 

Chefe da ONU “horrorizado” 

A ONU verificou cerca de 33.000 violações graves que afetaram mais de 22.500 crianças, principalmente rapazes, em 26 situações em todo o mundo. 

Os números mais elevados foram os de assassinatos e mutilações, com 11.649 crianças afetadas – um aumento de 35 por cento em relação ao relatório do ano passado.  Seguiram-se o recrutamento e a exploração de 8.655 crianças e o rapto de mais 4.356. 

Embora mais de metade das violações tenham sido cometidas por grupos armados não estatais, incluindo os designados como terroristas pela ONU, as forças governamentais foram as principais responsáveis por mortes e ferimentos, ataques a escolas e hospitais e pela recusa de acesso humanitário. 

O conflito em Israel e nos territórios palestinianos ocupados conduziu a um aumento de 155% das violações graves contra as crianças, segundo o relatório. 

“Estou chocado com o aumento dramático e com a escala e intensidade sem precedentes das graves violações contra crianças na Faixa de Gaza, em Israel e na Cisjordânia sob ocupação, incluindo Jerusalém Oriental, apesar dos meus repetidos apelos às partes envolvidas para implementarem medidas para pôr fim às violações graves”, escreveu Guterres. 

 

Lista negra anual 

O relatório anual contém um anexo sobre as partes que cometem violações graves. Como já foi amplamente noticiado, pela primeira vez, as forças armadas e de segurança israelitas foram incluídas na lista por matarem e ferirem crianças e atacarem escolas e hospitais. 

O Hamas e a Jihad Islâmica Palestiniana também foram acrescentados à lista, pela primeira vez, por matarem, ferirem e raptarem crianças.   

O relatório refere que a guerra no Sudão conduziu a um aumento “impressionante” de 480% das violações graves.    

O exército sudanês e as forças militares rivais, as Forças de Suporte Rápido (RSF), estão em guerra há mais de um ano e ambas constam na lista negra por matarem e mutilarem crianças e atacarem escolas e hospitais. 

As RSF também recrutaram e utilizaram crianças, para além de cometerem violações e outras violências sexuais contra elas. 

 

UNICEF “Sem balas. Uma rosa para cada criança”. Estas foram as poderosas palavras de Majd, de 10 anos, durante uma sessão psicossocial realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e parceiros no Sudão.

 

‘Estamos a falhar para com as crianças’ 

Apesar da multiplicação e da escalada das crises descritas no relatório, mais de 10.600 crianças anteriormente associadas a forças ou grupos armados receberam proteção, ou apoio à reintegração no ano passado.   

A ONU iniciou ou manteve um compromisso com as entidades em conflito em locais como o Burkina Faso, os Camarões, a Colômbia, a República Democrática do Congo, o Iraque, Israel e os territórios palestinianos ocupados, o Mali, Moçambique, a Nigéria, a Somália, o Sudão do Sul, a Síria, a Ucrânia e o Iémen. 

Em alguns casos, este compromisso levou à adoção de medidas que visam uma melhor proteção das crianças.   

A representante especial do secretário-geral para as Crianças e para os Conflitos Armados, Virginia Gamba, afirmou que o relatório é “uma chamada de atenção”. 

“Estamos a falhar para com as crianças”, afirmou. “Apelo à comunidade internacional para que se comprometa novamente com o consenso universal para proteger as crianças dos conflitos armados e apelo aos Estados para que cumpram a sua responsabilidade primária de proteger as suas populações e respeitem todas as normas e padrões aplicáveis na gestão de situações de conflito armado.” 

 

 

Artigo ONU News aqui