ONU pede menos consumo e menos produção para combater desertificação

O Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca visa promover a consciencialização pública dos esforços internacionais para combater a desertificação, lembrando que é possível alcançar a neutralidade da degradação do solo através do envolvimento e da cooperação das comunidades. Com a pandemia da covid-19, é mais importante do que nunca fortalecer a resiliência dos nossos sistemas alimentares e de água, de forma a reduzir os efeitos da pandemia na pobreza e na insegurança alimentar a nível mundial.

Atualmente, pelo menos 2 mil milhões de hectares de terra anteriormente produtiva estão degradados e mais de 70% dos ecossistemas naturais foram transformados. Até 2030, prevê-se que a produção alimentar exija 300 milhões de hectares adicionais de terra e que a indústria da moda explore outros 115 milhões – área equivalente ao tamanho da Colômbia. A exploração do solo contribui ainda para as alterações climáticas, com cerca de um quarto das emissões de gases de efeito de estufa provenientes da agricultura. Por outro lado, a produção de roupa e calçado causa 8% das emissões a nível global, número que deverá aumentar quase 50% até 2030.

Este ano, sob o tema “Food. Feed. Fibre”, o Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca é assinalado com foco na mudança de atitude da população em relação às principais causas de desertificação e degradação da terra: a produção e o consumo excessivos da humanidade. Para que, até 2050, tenhamos terrenos agrícolas capazes de atender à demanda de dez mil milhões de pessoas, é urgente que a população aprenda a reduzir o seu impacto pessoal. A gestão sustentável dos recursos responsáveis pela nossa alimentação (Food), pela alimentação dos nossos animais (Feed) e pelas fibras das nossas roupas (Fibre) é essencial para reconstruir a nossa relação com a Natureza, ao manter a terra fértil, proteger a biodiversidade e combater as alterações climáticas.

Desertificação na Europa 

Portugal e Espanha ilustram a gravidade da desertificação dos solos na União Europeia, mas o aparecimento de paisagens desertas na Europa já não é um exclusivo da Península Ibérica, com situações de grande gravidade no sul de Itália, sudeste da Grécia, Chipre e em zonas da Bulgária e da Roménia situadas na orla costeira do Mar Negro.

Num relatório de 2018 sobre a Desertificação, a Comissão Europeia destaca a “erosão dos solos, salinização, urbanização e migração” como razões que podem conduzir à desertificação nos países europeus. Os dados apontam para que, a curto prazo, o número anual de pessoas afetadas pela seca suba para 153 milhões (sete vezes mais do que o número atual), das quais metade residem em países da Europa do Sul, e para que, em 2050, 90% da superfície terrestre dos países europeus já esteja degradada, o que levará a cerca de 700 milhões de pessoas deslocadas por falta de terrenos férteis e sustentáveis.

63% do território português é suscetível à desertificação 

Quando se fala em desertificação na Europa, Portugal aparece no topo da lista. Caracterizado pela aridez do seu clima, com 3 a 5 meses secos por ano, o nosso país é um dos mais afectados por este fenómeno a nível europeu, com 63% da sua área classificada como suscetível à desertificação.

Dados recentes apontam para que, entre 1980 e 2010, a desertificação tenha afetado mais de metade do território nacional, ascendendo a 58% – mais 22 pontos percentuais face aos 36% de área sinalizada como desertificada nos 30 anos anteriores – a que acrescem ainda as áreas áridas do sudeste da Madeira e das ilhas do Porto Santo, Desertas e Selvagens.

Segundo uma auditoria do Tribunal de Contas, realizada no final de 2019, ao Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação, criado em 1996 e revisto pela última vez em 2014, o cenário futuro não é animador. Numa altura em que a desertificação tem vindo a aumentar, afetando principalmente as regiões do sul e do interior centro e norte do país, as previsões sobre as alterações climáticas “tornam expectável o acentuar dos riscos de desertificação”, acabando por potenciar um “maior risco de incêndios”, que resultam “na redução da capacidade produtiva dos solos e na escassez de recursos hídricos”.

O aumento da temperatura média é outro fator de preocupação. Com base em estudos e simulações de diferentes modelos climáticos, o relatório do  Tribunal de Contas prevê que, durante os meses de verão, se registe uma subida de 3ºC na zona costeira e de 7ºC no interior, o que resultará em máximas superiores a 35ºC e temperaturas mínimas de 20ºC. Para além disso, um aumento significativo “da frequência e intensidade de ondas de calor” e uma “redução da precipitação” serão algumas das alterações que deverão fazer-se sentir em Portugal, entre 2080 e 2100.