Diplomatas chegam a acordo sobre “cessação das hostilidades” na Síria, onde civis vivem horrores

No momento em que o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos advertia, esta quinta-feira, ontem, para a violência e abusos chocantes em Alepo e noutras regiões devastadas pela guerra na Síria; diplomatas de alto nível, reunidos em Munique (Alemanha) para debater o fim da crise no país, concordaram em avançar com os termos para uma “cessação das hostilidades” a nível nacional, na próxima semana.

Uma nota de imprensa emitida pelo porta-voz da ONU descreve os detalhes do acordo alcançado pelo Grupo Internacional de Apoio à Síria (constituído pela Liga Árabe, União Europeia, Organização das Nações Unidas e 17 outros países (incluindo os Estados Unidos da América e a Rússia). Este grupo estava a trabalhar, desde novembro, para garantir um cessar-fogo amplo e negociações políticas para pôr termo à guerra na Síria.

De acordo com a declaração do Grupo, “com vista a acelerar a entrega urgente de ajuda humanitária, a assistência deve começar de forma sustentável esta semana” em sete áreas sitiadas na Síria, incluindo a cidade de Madaya, que captou a atenção do mundo, recentemente, após a ONU e a Cruz Vermelha relatarem a existência de pessoas a morrer à fome ou a serem mortas ao tentarem fugir.

A declaração explica que a cessação das hostilidades irá começar dentro de uma semana, “após confirmação do governo sírio e da oposição, na sequência das devidas consultas na Síria”. Durante essa semana, um grupo de trabalho do Grupo irá desenvolver as questões relacionadas com esta implementação do cessar-fogo. O Grupo também chegou a acordo de que a cessação das hostilidades deve aplicar-se a todas as partes atualmente envolvidas nas hostilidades militares e paramilitares “salvo o Daesh, o Jabhat al-Nusra e outros grupos designados como organizações terroristas”, pelo Conselho de Segurança da ONU.

Entretanto, o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad al Hussein, condenou fortemente a rápida deterioração da situação dos direitos humanos na cidade de Alepo e seus arredores, onde “chocantes violações e abusos são cometidos diariamente.”

“As partes em conflito na Síria estão, constantemente, a afundar-se em níveis mais encarniçados de combate, sem se preocuparem, aparentemente, com o rasto de morte e destruição que estão a deixar por todo o país. Mulheres e crianças, idosos, doentes e feridos e pessoas com deficiência estão a ser usados como moeda de troca e “carne para canhão”, dia após dia, semana após semana, mês após mês. É uma situação grotesca”, classificou Zeid Ra’ad al Hussein.

 Condições humanas desastrosas em toda a Síria

O Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos também destacou que centenas de milhares de civis, noutras regiões da Síria, estão a enfrentar condições humanitárias desastrosas, particularmente aqueles sob cerco impostos pelas forças do governo e grupos armados afiliados e por grupos armados da oposição, incluindo o Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).

FOTO:OCHA/Josephine Guerrero

“Em Moadamiyet al-Sham, Madaya, Deir ez-Zor, Fuah e Kafreya as pessoas estão numa situação desesperada, com muitas mortes, incluindo de crianças, como resultado da desnutrição grave e falta de acesso a cuidados médicos”, disse.

Em Moadamiyet al-Sham, uma cidade localizada a poucos quilómetros de Damasco (capital), desde que as forças do governo estabeleceram um cerco total, em dezembro passado, cerca de 35 mil civis tentam resistir aos bombardeamentos intensos e aos ataques aéreos. Uma realidade que causou uma deterioração dramática das suas condições de vida, com os preços da comida a aumentarem bruscamente e sem terem disponível, sequer, leite em pó para recém-nascidos.

Emborao alguma comida tenha sido entregue na zona leste da cidade (controlada por forças pró-governo), pelo menos seis civis, incluindo cinco crianças, morreram, em janeiro, em resultado direto de desnutrição, e mais de 25 crianças com menos de dois anos sofrem de desnutrição e outros problemas de saúde relacionados.

Em Madaya, pelo menos 26 pessoas morreram de desnutrição desde o início do ano, apesar da chegada de um grande comboio humanitário, a 11 e 14 de janeiro. Pelo menos 300 pessoas, incluindo mulheres e crianças, necessitam de ser imediatamente evacuados.

Cerca de 200 mil pessoas em Deir ez-Zor estão sob o cerco imposto pelo EIIL, vivendo com cortes de água e sem eletricidade. Há relatos de que várias pessoas acusadas de contrabando de comida para o interior da cidade têm sido executadas pelos combatentes do EIIL.

Apesar da entrega de ajuda humanitária nas aldeias de Fuah e Kafreya, a 11 e 14 de janeiro, o Gabinete do Alto Comissário para os Direitos Humanos da ONU relatou que a situação permanece difícil, com, aproximadamente, 20 mil civis a viver sob o cerco dos grupos armados da oposição – Ahrar al-Sham e Frente al-Nusra -, que ameaçam matar os moradores em retaliação pelas ações do governo nas áreas sob o seu controlo.

 Violação do direito humanitário nternacional

“Provocar a morte de civis por inanição, de forma deliberada, enquanto tática de guerra constitui uma clara violação do direito internacional humanitário”, disse Zeid. “O ataque a civis, incluindo milhares de crianças, é abominável e pode constituir crime de guerra e crime contra a Humanidade. Os responsáveis por estes atos, incluindo os que os ordenam, devem ser levados à justiça.”

“Recordo a todas as partes que têm obrigações, à luz da lei internacional  dos direitos humanos e da lei humanitária internacional, de protegerem sempre os civis e permitirem o livre acesso para entrega de ajuda humanitária, recolha e tratamento dos doentes  e feridos e de não levarem a cabo ações que irão privar os civis do seu direito à alimentaçãoe e cuidados de saúde”, acrescentou o Alto Comissário para os Direitos Humanos da ONU.

Zeid destacou, também, que todas as partes num conflito têm obrigações de não colocar a população civil em perigo, apropriando-de sos seus abrigos ou de outras estruturas protegidas, como escolas e hospitais.

“As negociações de paz em Genebra devem ser retomadas tão rápido quanto possível”, insistiu. “É inconcebível que as diversas partes não se consigam sequer sentar-se ao redor da mesa, quando, em consequência das suas ações, mais de um quarto de um milhão de pessoas morreram e o resto da população está em enorme sofrimento. Uma solução de paz para acabar com esta horrível guerra deve ser firmada numa base sólida de respeito poelos direitos humanos.”

 

12 de fevereiro de 2016, Centro de Notícias da ONU/Traduzido & Editado por UNRIC


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