Iémen: 7 anos de maior crise humanitária do mundo

Hoje, marcamos os 7 anos desde o início da guerra e da crise humanitária no Iémen que, infelizmente, não mostra sinais de abrandar. O país enfrenta atualmente a pior crise humanitária no mundo com mais de 80% da sua população, ou seja, 23.4 milhões de pessoas, a precisar de assistência humanitária.

Génese

A guerra no Iémen começou há 7 anos, em 2015, mas para percebermos bem as origens deste conflito temos de recuar até 2011. Entre 2010 e 2011, uma onda revolucionária de motins, protestos e rebeliões intitulada “Primavera Árabe” espalhou-se pelas nações árabes, incluindo o Iémen. A revolução iemenita de 2011-2012 começou com protestos contra a corrupção e o desemprego e acabou com a renúncia do presidente autoritário Ali Abdullah Saleh, que liderava o país há 23 anos. O vice-presidente Mansour Hadi foi declarado o novo presidente do Iémen.

O âmbito desta revolução era tornar o Iémen num país pacífico, estável e próspero, mas teve o efeito contrário, e hoje o país mais pobre da Península Arábica enfrenta uma crise política, humanitária e de desenvolvimento.

@UNOCHA/Giles Clarke. No “parapeito” da sua casa, uma criança iemenita olha para os destroços na cidade de Taiz.

O ex-presidente Saleh, comprometido a voltar ao poder, aliou-se militarmente aos seus inimigos: os Houthis, que são um grupo de rebeldes xiitas que surgiram no norte do Iémen no início dos anos 2000 e fomentaram o conflito preexistente no país entre os muçulmanos xiitas e sunitas. Em 2014, os Houthis e o ex-Presidente Saleh invadiram a capital do Iémen, Sana, e durante meses o conflito político continuou a escalar até que no dia 25 de março de 2015 uma aliança regional liderada pela Arábia Saudita, pelos Estados Unidos da América e pelos Emirados Árabes Unidos iniciou uma série de ataques aéreos contra os Houthis, com o objetivo de restaurar o governo de Hadi. Estes ataques levaram à declaração oficial de guerra pelo líder dos Houthis, Abdul-Malik al-Houthi.

Desde esse dia, o Iémen e a sua população de 30.5 milhões de pessoas vivem num “estado crónico de emergência, marcado pela fome, doença e outras misérias.”

Crise agora

Se no Iémen vivessem apenas 100 pessoas, 80 precisariam de assistência humanitária, 66 não teriam acesso a alimentos, 67 não teriam acesso a água, 59 não teriam acesso a cuidados de saúde e 11 estariam subnutridas. Mas no Iémen vivem 30.5 milhões de pessoas.

Esta é a conclusão de uma campanha de solidariedade do Programa Alimentar Mundial que, em 2022, tenciona alimentar 13 milhões de iemenitas, dar apoio a 3.7 milhões de mulheres grávidas e crianças abaixo dos 5 anos e apoiar os projetos de desenvolvimento de 1.5 milhões de pessoas.

As Nações Unidas acreditam que o Iémen “está à beira da catástrofe” e enfrenta uma crise alimentar, económica e de saúde.

2021 foi um dos anos mais difíceis para o Iémen que, com a hiperinflação e com desvalorização da moeda, viu os preços dos alimentos duplicar. Atualmente, 13 milhões de pessoas precisam de assistência alimentar urgente e 17.4 milhões de iemenitas estão subnutridos. Se nada for feito estima-se que este número aumente para 19 milhões de pessoas subnutridas no fim de 2022. A situação é particularmente grave nas crianças e mulheres grávidas com 1.3 milhões grávidas ou a amamentar e 2.2 milhões de crianças abaixo dos 5 anos a precisarem de tratamento para a desnutrição aguda. Devido à subnutrição muitas crianças enfrentam problemas “físicos e cognitivos” e o impacto desta guerra será pressentido nas gerações futuras.

Para além da crise alimentar, o Iémen enfrenta uma dais maiores crises de escassez de água e de higiene com mais de 16 milhões de pessoas e 8.47 milhões de crianças a precisarem urgentemente de acesso a água e cuidados de saneamento e higiene. Só um terço da população do Iémen tem acesso a uma fonte de água constante. A falta de saneamento e higiene no país levou a propagação de doenças. Infelizmente, cerca de 20.1 milhões de pessoas não têm acesso a serviços de saúde básicos o que leva à disseminação de doenças como a cólera, a difteria e mais recentemente a covid-19. A Organização Mundial da Saúde (OMS) determinou que nestes últimos 7 anos o Iémen sofreu o “maior surto de cólera do mundo”. Adicionalmente, a taxa de mortalidade do covid-19 foi uma das maiores no mundo com 1 em cada 4 infetados a sucumbir ao vírus. Para além disso, o Iémen é um dos países com a menor taxa de vacinação contra a covid-19 com só 2% da população vacinada.

@UNOCHA/Giles Clarke. Um pediatra verifica se um bebé apresenta sinais de subnutrição no centro de alimentação terapêutica apoiado pela OMS num hospital na cidade de Marib.

Todos estes números e estatísticas pintam um quadro mórbido e trágico do Iémen, mas as Nações Unidas estão empenhadas em ajudar e a apoiar o país.

Conferência sobre o Iémen

A Conferência sobre o Iémen, que ocorreu na semana passada, contou com a presença e os apelos do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, o enviado especial da ONU para o Iémen, Martin Griffiths, e a enviada especial do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Angelina Jolie.

Com o agravamento do conflito militar, a propagação de novas doenças como a covid-19 e o aumento de preços alimentares devido à guerra na Ucrânia, a necessidade de assistência humanitária aumentou significativamente e no dia 16 de março durante a Conferência sobre o Iémen vários Estados-membros e entidades comprometeram-se a doar 1.3 mil milhões de dólares para o apoio humanitário no Iémen.

No entanto isto vai muito aquém do valor necessário de 4.3 mil milhões.

@OCHA. O enviado especial da ONU para o Iémen, Martin Griffiths, numa conferência de imprensa no Iémen em 2018.

Ao olhar para o futuro Martin Griffiths relembra-nos que não podemos deixar que a crises humanitária na Europa ofusquem as crises no Médio Oriente e na África como a crise no Iémen e que não nos podemos esquecer do Iémen.


Direito Internacional e Justiça

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