“Panama Papers”: especialistas da ONU pedem fim do sigilo financeiro para deter fundos ilícitos

No rescaldo da divulgação de documentos financeiros confidenciais de um escritório de advocacia do Panamá, especialistas da Organização das Nações Unidas em direitos humanos apelam à comunidade internacional que coloque, urgentemente, fim ao sigilo financeiro.

“A evasão fiscal e o fluxo de fundos de origem ilícita minam a justiça e privam os governos dos recursos necessários para a realização dos direitos económicos, sociais e culturais”, alertou Juan Pablo Bohoslavsky, especialista independente da ONU em dívida externa e direitos humanos, uma vez que os documentos apelidados de “Panma Papers” mostraram como empresas, indivíduos com grande fortuna e pessoas politicamente expostas têm, sistematicamente, escondido bens em mais de 21 jurisdições offshore.

“Os clientes devem ter tido diferentes motivos para depositar os seus bens em mais de 210 mil falsas empresas secretas. Mas a evasão fiscal,  esconder corrupção os fundos com origem criminal parecem ser uma razão proeminente”, disse Bohoslavsky, autor do recente estudo sobre fluxos financeiros ilícitos apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU.

O especialista destacou que as falsas empresas também foram usadas, no passado, por grupos e indivíduos violadores de sanções, traficantes de droga, envolvidos no comércio ilícito de armas, terrorismo, bem como por governantes autoritários responsáveis por graves violações dos direitos humanos.

“A evasão fiscal destroi a confiança nas instituições públicas e no Estado de Direito e reduz a capacidade orçamental para investir nos cuidados de saúde pública, educação, segurança social e outros bens e serviços públicos”, explicou o especialista. “Os fundos públicos que são essenciais para garantir os direitos económico, social e cultural para todos estão a ser roubados às pessoas”, acrescentou.

 

O papel dos intermediários

O Gabinete dos direitos humanos da ONU notou que a fuga da documentação mostra que alguns bancos e intermediários financeiros não conseguiram trabalhar com diligência com os seus clientes. Muitos deles devem, inclusive, ter ajudado e induzido à evasão fiscal, corrupção e outras atividades criminosas. De acordo com os “Panama Papers” mais de 14 mil bancos, escritórios de advocacia, incorporadores da empresa ou outros intermediários criaram empresas, fundações e fundos para os clientes.

Bohoslavsky relembra que o Conselho de Direitos Humanos da ONU reconheceu que os fluxos de fundos com origem ilícita privam muitos Estados dos recursos necessários para realizar, progressivamente, os direitos humanos. Numa resolução adotada no mês passado, o Concelho salientou a necessidade de transparência e de procedimentos efetivos e com a devida diligência dos intermediários financeiros.

Reduzir substancialmente os fluxos financeiros ilícitos, até 2030, é uma das metas dos novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. A redução de tais fluxos também ficou acordada na Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, que teve lugar em julho de 2015, em Adis Abeba.

“Os Estados necessitam, agora, de tomar medidas para honrar esses compromissos”, disse o especialista. “Os “Panama Papers” sublinham a necessidade de tornal legalmente vinculativa, em todos os países, a divulgação pública da informação sobre os proprietários e beneficiários de offshores. Os Estados devem colocar um fim a tal sigilo bancário prejudicial, para o qual não há justificação plausível”, acrescentou.

 

Troca automática de informação fiscal

Bohoshlavsky exortou a que se avance para um sistema global de troca automática de informação fiscal, a qual assegura que os países em desenvolvimento podem beneficiar em pé de igualdade destes fluxos. “As instituições financeiras e intermediários que facilitam a evasão fiscal, corrupção ou outras atividades criminosas também devem ser responsabilizados”, disse ele.

De acordo com as estimativas do grupo de investigação sobre Integridade Financeira Global, baseado em Washington, os fluxos financeiros ilícitos de economias emergentes e em desenvolvimento relacionados com a evasão fiscal, crime, corrupção e outras atividades ilícitas atingem os 1,1 biliões de dólares, em 2013. Esta é uma significativa fuga de recursos que cresceu, durante a última década,  a uma média de 6,5%, por ano.

Os especialistas independentes ou relatores especiais são indicados pelo Conselho de Direitos Humanos, baseado em Genebra, para examinar e relatar a situação de um país ou de um tema específico de direitos humanos. As posições são honorárias, não fazendo os especialistas parte dos quadros de funcionários da ONU e não sendo, como tal, pagos pelo seu trabalho.

 

11 de abril de 2016, Centro de Notícias da ONU/Traduzido & Editado por UNRIC


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