Partes em conflito na Síria matam milhares de detidos, que ONU considera crimes contra a Humanidade

Milhares de detidos foram mortos sob a custódia das várias partes em conflito na Síria, ao longo dos últimos quatro anos e meio. Milhares de detidos são mantidos reféns pelo governo e espancados ou torturados até à morte. Da parte dos grupos anti-governamentais também há relatos de agressões e execuções de prisioneiros. Estes casos são classificados como crimes de guerra e crimes contra a Humanidade num relatório da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria.

Numa referência específica aos detidos pelo Governo, Paulo Pinheiro, presidente desta comissão,  disse que “Quase todos os detidos que sobreviveram à detenção sofreram abusos inimagináveis”. Paulo Pinheiro apresentou o relatório “Longe da vista, longe do coração: mortes na prisão na República Árabe da Síria”, esta segunda-feira, em Genebra (Suíça).

“Para os comuns cidadãos sírios, o espectro da captura ou rapto, e os horrores quase inevitáveis que se seguiram, paralizaram comunidades em todo o país”, acrescentou.

O relatório baiseia-se em 621 entrevistas e extenso material documental sobre as mortes causadas pelas várias partes em conflito, entre 10 de março de 2011 e 30 de novembro de 2015. Nas recomendações, o documento apela ao Conselho de Segurança da ONU para adotar sanções específicas contra as pessoas, as agências e os grupos suspeitos de responsabilidade ou cumplicidade com as mortes, torturas e desaparecimento forçado.

Esta comissão foi estabelecida pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em 2011, para investigar e registar todas as violações das leis dos direitos humanos e alegações de crimes contra a Humanidade e crimes de guerra na Síria e identificar, quando possível, os responsáveis, com vista a que sejam responsabilizados.

Forças governamentais cometerem crimes deliberadamente

O documento revela, em pormenor, que os civis foram arbitrariamente presos, detidos ilegalmente, feitos reféns ou sequestrados e apresenta relatos de testemunhas oculares e provas documentais que evidenciam e sugerem, com fortes indícios, que dezenas de milhares de pessoas são detidas pelo governo a qualquer momento. Outros tantos milhares de pessoas desaparecem após a detenção pelas forças de segurança ou enquanto se deslocavam no território controlado pelo governo.

O relatório descreve, também, por vezes de forma arrepiante, como milhares de detidos pelo governo foram espancados até à morte ou morreram em resultado dos ferimentos sofridos devido à tortura. Muitos outros pereceram em consequência das condições de vida desumandas e da privação dos cuidados médicos.

Estas mortes, sublinha o relatório, ocorrem com grande frequência, durante um longo período de tempo e em vários locais controlados pelo aparelho de Estado Sírio, com um apoio logístico significativo a envolver vastos recursos estatais.

As autoridades governamentais mantinham, intencionalmente, estas condições precárias, e mesmo fatais, de detenção para os prisioneiros e estavam cientes de que levariam à morte em massa dos detidos. Estas ações de extermínio, no seguimento de uma política de Estado, são classificáveis como crime contra a Humanidade, acrescenta o relatório.

A da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria afirma que o Governo sírio também cometeu outros crimes contra a Humanidade tais como homicídio, violação ou outras formas de violência sexual, tortura, prisão, desaparecimento forçado e outros atos desumanos. Estas violações constituem crimes de guerra, tendo sido cometidas após o início do conflito armado.

Grupos anti-governo também cometem atrocidades

Grupos armados anti-governo e grupos terroristas, que tomaram controlo de partes do território, também mantiveram prisioneiros sobre condições cruéis, de acordo com o relatório. Alguns grupos armados anti-governo estabeleceram locais improvisados de detenção para onde eram transportados soldados do governo capturados, tendo estes sido maltratos e executados.

“Temos evidências chocantes de como as pessoas foram, sumariamente, executadas após julgamento ilegítimo e de indivíduos feitos reféns que morreram sob a custódia de grupos armados”, disse o comissário Vitit Muntarbhom.

O grupo Jabhat Al-Nusra e vários outros grupos armados anti-governo cometeram crimes que são considerado pela ONU como crimes de guerra: homicídio, tratamento cruel e tortura.

Em áreas sob o controlo do auto-denominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ou Daesh), os terroristas submetem os detidos a sérios abusos, incluindo tortura e execuções sumárias. O Daesh cometeu crimes contra a Humanidade na forma de homicídio e tortura e outros crimes de guerra.

Com o relatório, a Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria espera que sejam aumentados os esforços para encontrar um caminho que leve justiça aos civis sírios, assim como para apoiar as autoridades processuais e judiciais que procuram levar a tribunal estes casos, seja ao nível nacional como internacional.

“A responsabilização por estes e outros crimes deve fazer parte de qualquer solução política”, afirma a comissária Carla del Ponte. “Mas, ao invés, estas violações têm sido cometidas com total impunidade”, acrescentou.

 

9 de fevreiro de 2016,Centro de Notícias da ONU/Traduzido & Editado por UNRIC


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